Seu rosto também é refletido no espelho, cara pálida: Antropologia brasileira e seu pacto narcísico da branquitude
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v34i1pe230679Palavras-chave:
racismo, etnografia, subjetividade, posicionalidade, paridade racialResumo
Este ensaio pretende discutir as dinâmicas étnico-raciais na formação da ciência antropológica, sobretudo na noção hegemônica de “Antropologia brasileira” que se diferenciaria por não funcionar a partir do exotismo. Entretanto, compreendo que o exotismo delegado às Antropologias centrais foi replicado junto aos nativos internos do Brasil, a saber, brancos na posição de sujeito, enquanto negros, indígenas e quilombolas figuravam, essencialmente, como objetos. Para esmiuçar esta narrativa, aciono produções da disciplina para tensionar o seu desenvolvimento enquanto empreendimento científico, político e subjetivo, aos conceitos de “branquitude”, “mundo dos brancos” e “pacto narcísico da branquitude” para analisar como, implicitamente, se tem contribuído para uma história única da disciplina. Para, então, discutir produções de antropólogos negros e indígenas que, no encontro com a alteridade branca, de antropólogos acadêmicos, identificaram práticas tacitamente violentas. Por fim, indico a nomeação da norma como estratégia micropolítica para desconstrução da branquitude e como meio possível para uma Antropologia brasileira honesta e pluriepistêmica.
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eISSN: 2316-9133