Falácias do “destino crístico”: o mito de Ourique (1139) e as respostas anticlericais de Alexandre Herculano (1810-1877)
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2175-3180.v16i31p147-172Palavras-chave:
Alexandre Herculano, Mito de Ourique, Polêmica, AnticlericalismoResumo
As tentativas de uma investigação científica da História, tema muito caro ao século XIX, foram levadas a cabo, em Portugal, por Alexandre Herculano (1810-1877), que, em 1846, iniciou a publicação de História de Portugal. Contudo, a obra gerou descontentamento, principalmente de setores reacionários do clero luso e, em 1850, irrompeu na denominada Polêmica de Ourique: Herculano remeteu cartas públicas ao Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. Guilherme Henriques de Carvalho (1793-1857), bem como ao redator do periódico católico A Nação e a um escritor e oficial do Exército Português, defensor do Absolutismo, António Lúcio Maggessi Tavares (1806-1877). Há, ainda, uma missiva pessoal ao padre Francisco Recreio (1800-1857), que não fora coligida pelo autor nos opúsculos publicados posteriormente. Essas mensagens se originam porque o historiador omitiu propositalmente em sua obra o mito de Ourique, segundo o qual Cristo teria, milagrosamente, aparecido ao primeiro rei lusitano, D. Afonso Henriques (1109?-1185), antes da peleja contra os mouros – a Batalha de Ourique (25 de Julho de 1139) – e, dessa forma, com a vitória cristã, o Portugal medieval teria sido fundado “pela vontade de Deus” e com um “destino crístico”, ou seja, de um predileto ungido. Sob as propostas de Eduardo Lourenço, a quem rendemos homenagem neste ano de seu centenário, mas também de Ana Isabel Buescu e de Luís Machado de Abreu, analisaremos, neste estudo, o significado da crença no milagre medieval para o período oitocentista e os discursos das correspondências de Herculano em meio à polêmica. Verificaremos, sobretudo, o teor da missiva ao arcebispo de Lisboa e a carta ao padre Recreio, bem como o seu conteúdo anticlerical.Downloads
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