Fri, 24 Jan 2025 in Novos Olhares – Revista de Estudos Sobre Práticas de Recepção a Produtos Midiáticos
A Reconfiguração da Hegemonia na Era Digital: o Papel dos Algoritmos no Controle da Informação
Resumo
Este artigo investiga, por meio de uma revisão bibliográfica, o conceito de hegemonia algorítmica e a influência crucial que os algoritmos exercem na mediação dos fluxos de informação nas plataformas digitais. Ao fundamentar-se em autores relevantes para o tema, como Antonio Gramsci, que discute a natureza da hegemonia; Gilles Deleuze, que aborda as dinâmicas das sociedades de controle; e David Lyon, que analisa a vigilância digital, o texto examina como os algoritmos não apenas moldam debates públicos, mas também reconfiguram as estruturas de poder contemporâneas. A análise aponta para uma mudança qualitativa na hegemonia, que se torna organizada e sustentada por sistemas algorítmicos, os quais controlam invisivelmente as dinâmicas sociais e políticas na era digital. Essa reconfiguração levanta questões importantes sobre a autonomia dos indivíduos, a diversidade de vozes no espaço público e os riscos associados à centralização do poder informacional.
Main Text
A teoria da hegemonia, desenvolvida por Antonio Gramsci (1971), oferece uma visão crítica sobre o controle ideológico e cultural que grupos dominantes exercem para garantir o consenso e a estabilidade social, moldando normas e valores que são aceitos como naturais ou inevitáveis. Em seu conceito clássico, a hegemonia não se baseia apenas no uso da força, mas principalmente na construção de uma liderança intelectual e moral que permeia as instituições e a vida cotidiana. No entanto, nas sociedades contemporâneas, altamente dependentes de tecnologias digitais, essa hegemonia tem sido profundamente transformada.
Com o advento das plataformas digitais e da onipresença dos algoritmos, o poder ideológico é exercido de maneira cada vez mais invisível, mas igualmente eficaz. Os algoritmos, que hoje regulam a maioria das interações sociais e o fluxo de informações, desempenham um papel central na estruturação da realidade social. Eles determinam o que é visível, o que é amplificado e o que é marginalizado no ambiente digital, agindo como mediadores invisíveis que moldam as percepções, os comportamentos e, consequentemente, os consensos sociais. Nesse sentido, a hegemonia passa a ser construída por sistemas algorítmicos que, embora invisíveis e operando nos bastidores, exercem um controle ideológico difuso, direcionando o debate público e organizando as estruturas de poder de forma automatizada.
Este artigo, inspirado pelas reflexões de Gramsci (1971), busca atualizar a noção de hegemonia para o contexto da era digital, focando no papel dos algoritmos na configuração do poder contemporâneo. A transição de uma hegemonia cultural e ideológica centralizada para uma hegemonia algorítmica descentralizada e difusa levanta importantes questões sobre controle social, vigilância e a autonomia dos indivíduos. Se, para Gramsci (1971), a hegemonia era conquistada por meio de um longo processo de construção ideológica e consenso, nas sociedades digitais, essa hegemonia é imposta de maneira quase imperceptível, por meio de tecnologias automatizadas que regulam a vida cotidiana de milhões de indivíduos.
A crescente presença de algoritmos e plataformas digitais na vida social implica uma nova forma de organização do poder, em que o controle sobre o fluxo de informações e a atenção dos usuários está concentrado em um pequeno número de corporações que detêm o monopólio das infraestruturas digitais. Nesse sentido, a hegemonia na era digital assume características qualitativamente diferentes daquelas observadas por Gramsci (1971), enquanto se baseia em formas invisíveis de controle e vigilância, operadas através da extração e processamento de dados comportamentais. Este artigo, portanto, examina como esses sistemas algorítmicos remodelam o poder contemporâneo, problematizando os efeitos da hegemonia digital nas dinâmicas sociais, políticas e culturais.
Ao longo do texto, por meio de uma revisão bibliográfica, analisaremos como essa hegemonia organizada por plataformas digitais e algoritmos não apenas modula as interações sociais e políticas, mas também influencia a formação de consensos, a visibilidade de certas vozes e narrativas e a marginalização de outras. Assim, este estudo busca aprofundar o entendimento sobre os mecanismos invisíveis de controle que caracterizam o poder algorítmico na era digital, propondo uma reflexão crítica sobre as implicações éticas, sociais e políticas dessa nova forma de hegemonia.
O Conceito de Hegemonia Algorítmica
O conceito de hegemonia algorítmica emerge como uma ideia central no entendimento das dinâmicas de poder contemporâneas, especialmente quando analisado à luz das teorias de Deleuze (1992) e Foucault (1975) sobre controle e disciplina, bem como das investigações de Lyon (2014) sobre vigilância digital. Essa análise permite uma reflexão crítica sobre como os algoritmos, como instrumentos de poder, não apenas organizam e filtram a informação, mas também moldam comportamentos e interações sociais de maneiras sutis e poderosas.
Deleuze (1992), ao introduzir a noção de sociedade de controle, amplia e atualiza a obra de Foucault. Enquanto Foucault (1975) discute a sociedade disciplinar - caracterizada pela regulação da vida via instituições como prisões, escolas e hospitais -, Deleuze (1992) argumenta que as sociedades contemporâneas operam por um controle mais difuso e virtual. Esse controle é exercido por meio de redes digitais e tecnologias de informação, em que o poder não é imposto diretamente sobre os corpos, mas sim por meio da modulação das experiências e comportamentos dos indivíduos. A liberdade, nesse contexto, não é eliminada, mas reformulada: os indivíduos são levados a se comportar de determinadas maneiras, não pela coerção, mas pela sedução e pela persuasão.
Essa nova forma de controle se articula com a ideia de hegemonia algorítmica, caracterizada pela capacidade dos algoritmos de determinar quais informações são apresentadas e quais permanecem ocultas. Essa mediação algorítmica transforma o espaço público, uma vez que a visibilidade de informações e vozes depende diretamente do funcionamento de sistemas algorítmicos que priorizam conteúdos com maior potencial de engajamento. Nesse sentido, a hegemonia algorítmica não apenas define o que é visto, mas também influencia a formação de opiniões e a construção de narrativas, moldando o debate público.
Lyon (2014) complementa essa análise ao explorar as implicações da vigilância digital. Segundo o autor, a vigilância contemporânea é intrínseca ao funcionamento dos algoritmos, que não apenas monitoram os comportamentos dos usuários, mas também processam grandes volumes de dados para prever ações futuras. Nesse contexto, a vigilância se torna um mecanismo de controle social que opera de forma invisível, muitas vezes sem o consentimento ou mesmo o conhecimento dos indivíduos. Isso gera uma nova dinâmica de poder em que as empresas que controlam os algoritmos - frequentemente plataformas de mídia social e motores de busca - assumem um papel dominante na modulação das interações sociais. O monitoramento constante e a coleta de dados tornam-se não apenas uma prática de controle, mas um recurso valioso que essas plataformas utilizam para gerar lucro, tornando a atenção dos usuários um ativo mercadológico fundamental.
A intersecção entre as perspectivas de Deleuze (1992), Foucault (1985) e Lyon (2014) permite entender a hegemonia algorítmica como uma manifestação contemporânea do poder que transcende as formas tradicionais de controle social. A dinâmica de controle algorítmico não se limita a decidir o que os indivíduos veem; ela também molda as expectativas e os comportamentos, levando a um ambiente em que as decisões e as preferências são cada vez mais influenciadas por sistemas que operam em segundo plano. Isso não só reforça a dominação das vozes hegemônicas, mas também marginaliza narrativas alternativas, contribuindo para a polarização e a fragmentação do espaço público.
Além disso, essa análise é aprofundada por Ferrari e Graham (2021), que consideram que a hegemonia algorítmica se manifesta na maneira como essas tecnologias se tornam normativas, estabelecendo padrões de comportamento e expectativas que podem ser internalizados pelos usuários. Isso é particularmente evidente nas plataformas digitais de trabalho, onde a interação entre trabalhadores e algoritmos não é apenas funcional, mas também profundamente influenciada por relações de poder.
Um aspecto crucial da hegemonia algorítmica, apontado por Ferrari e Graham (2021), é a sua natureza “caixa preta”. Muitas vezes, os algoritmos operam de maneira opaca, dificultando a compreensão de como as decisões são tomadas e quais dados são utilizados. Essa falta de transparência gera assimetrias de informação, nas quais os trabalhadores e consumidores se tornam dependentes de sistemas que não compreendem completamente. Essa dependência pode levar a uma aceitação passiva das condições impostas pelas plataformas, reforçando a hegemonia algorítmica.
No entanto, a hegemonia algorítmica não é absoluta. Ferrari e Graham (2021) discutem a existência de fissuras nesse poder, momentos em que os algoritmos não governam como pretendido. Essas fissuras são oportunidades para resistência e contestação. Os trabalhadores, por exemplo, podem manipular, subverter ou romper com as dinâmicas algorítmicas, desafiando as narrativas que as plataformas tentam construir sobre seu papel como mediadores neutros. Essa resistência pode se manifestar de várias formas, desde a organização coletiva até a utilização criativa das ferramentas disponíveis.
Além disso, a hegemonia algorítmica deve ser entendida em um contexto mais amplo de desigualdade social e econômica. As plataformas digitais frequentemente perpetuam e amplificam desigualdades existentes, criando um ambiente onde o poder é concentrado nas mãos de poucos, enquanto a maioria opera sob condições precárias. A análise crítica da hegemonia algorítmica, portanto, deve incluir uma reflexão sobre como essas tecnologias podem ser reimaginadas e reconfiguradas para promover maior equidade e justiça social.
Ao discutir a commodificação da atenção e a produção de valor na economia digital, Fuchs (2013) argumenta que as plataformas digitais operam com base em um modelo de “acumulação por despossessão”, no qual o capital é gerado a partir da extração de dados pessoais e comportamentais dos usuários. Essa dinâmica transforma os usuários em “produtores” involuntários de dados, cuja interação nas plataformas alimenta os sistemas algorítmicos que, por sua vez, moldam a informação que eles recebem. Assim, a hegemonia algorítmica não é apenas uma questão de controle sobre a informação, mas também uma questão de exploração econômica, na qual o valor gerado a partir da atenção dos usuários é reaproveitado pelas grandes corporações.
Em suma, a hegemonia algorítmica representa um deslocamento significativo na forma como o poder é exercido na era digital. À medida que os algoritmos se tornam mediadores essenciais da informação e da comunicação, a forma de controle se torna menos visível, mas não menos eficaz. A análise das interações entre as teorias de Deleuze (1992), Foucault (1985) e Lyon (2014), juntamente com a crítica de Fuchs (2013), revela a complexidade e as implicações da hegemonia algorítmica nas sociedades contemporâneas. A hegemonia, agora mediada por sistemas algorítmicos, segundo as perspectivas de Ferrari e Graham (2021), redefine as dinâmicas sociais e políticas, levantando questões cruciais sobre a autonomia individual, a diversidade de vozes no espaço público e os riscos da centralização do poder informacional. Essa reflexão se torna vital para entender o presente e projetar alternativas que promovam uma esfera pública mais democrática e pluralista, desafiando as estruturas de poder que se estabelecem no contexto da vigilância digital.
Modulação Algorítmica como Hegemonia
A ideia de modulação algorítmica discutida por Silveira (2019) e Cassino (2021) apresenta um conceito crítico para entender como os algoritmos, por meio de controle invisível, têm um papel central na regulação dos fluxos de atenção, moldando não apenas as interações sociais, mas também as percepções e comportamentos de indivíduos. A modulação algorítmica se manifesta de forma especialmente poderosa nas plataformas digitais, onde os algoritmos personalizam a experiência de cada usuário com base em dados colhidos por práticas de data mining e profiling, como descritos por Jesus-Silva e Lima (2024) e Seto (2024). Essa personalização opera como uma ferramenta estratégica de controle, pois os algoritmos utilizam grandes volumes de dados para prever e influenciar comportamentos, favorecendo interesses comerciais e moldando interações de maneira invisível e altamente eficaz.
Ao considerar as perspectivas de Silveira (2019) e Cassino (2021), a modulação algorítmica vai além de simplesmente sugerir conteúdo aos usuários; trata-se de um processo dinâmico e contínuo de controle social. Os algoritmos, ao determinar o que aparece nos feeds, vídeos recomendados e nos resultados de busca, estão controlando diretamente as formas como as pessoas interagem com o mundo digital e com a informação. Esse controle não é evidente, mas sutil e insidioso, pois ao adaptar a experiência digital para maximizar o engajamento, as plataformas garantem que os usuários estejam constantemente imersos em um fluxo de informações que reforça e potencializa suas preferências, criando um ecossistema informacional fechado.
Essa forma de modulação algorítmica é consistente com a lógica hegemônica descrita por Gramsci (1971), embora em uma forma tecnológica mediada e digitalizada. Enquanto Gramsci (1971) via a hegemonia como o controle ideológico exercido por meio da cultura e das instituições, na era digital, essa hegemonia é também exercida por algoritmos que não apenas gerenciam informações, mas moldam ativamente os espaços discursivos nos quais as interações sociais ocorrem. Medeiros (2020) e Seto (2024) apontam que essa personalização algorítmica por meio de data mining e profiling é central para a manutenção dessa hegemonia, já que ela é projetada para maximizar o controle e o engajamento, ao mesmo tempo, em que oculta a natureza comercial e manipulativa desse processo.
A análise de O’Neil (2016) aprofunda esse debate ao introduzir o conceito de política discursiva algorítmica. Segundo a autora, os algoritmos exercem uma influência significativa sobre o debate público ao filtrar quais informações são visíveis e quais são relegadas à invisibilidade. Isso cria um ambiente onde certos discursos são amplificados enquanto outros são marginalizados, segundo os interesses comerciais e ideológicos das plataformas que controlam os algoritmos. Dessa forma, a modulação algorítmica atua como um mecanismo de poder hegemônico, pois controla o acesso à informação e estabelece os parâmetros dentro dos quais os debates públicos podem ocorrer.
A política discursiva criada pelos algoritmos não apenas seleciona conteúdos, mas molda ativamente o comportamento dos usuários ao incentivá-los a consumir e interagir com conteúdos que geram maior engajamento. Silveira (2019) e Cassino (2021) ressaltam que essa personalização ocorre de forma invisível, sendo imperceptível para a maioria dos usuários, o que a torna ainda mais eficaz em sua capacidade de moldar a realidade social. Ao controlar o que é visto, discutido e compartilhado, os algoritmos moldam os debates públicos e as opiniões, criando uma hegemonia algorítmica que reforça o status quo e limita o surgimento de discursos que desafiam as narrativas dominantes.
As plataformas digitais, ao moldarem a experiência informacional dos usuários, alinham essa modulação com seus interesses comerciais. Como explica Cassino (2021), a lógica por trás da modulação algorítmica é altamente comercial, favorecendo interações que geram mais dados comportamentais e, portanto, mais lucro. O objetivo dessas plataformas é manter o usuário envolvido por períodos cada vez maiores, o que resulta em maior coleta de dados e mais oportunidades de segmentação publicitária. Assim, a hegemonia algorítmica não se limita a influenciar o comportamento dos indivíduos em termos de opiniões ou preferências; ela também os transforma em produtos de valor econômico, onde suas interações e dados comportamentais são mercantilizados.
Aqui, o debate se conecta à crítica de Zuboff (2019) sobre o capitalismo de vigilância. A autora argumenta que as plataformas digitais transformaram os dados pessoais em uma nova forma de capital, utilizando algoritmos para prever e moldar comportamentos em larga escala. Essa prática reforça a hegemonia algorítmica, pois concentra o poder nas mãos de grandes corporações que controlam os fluxos de informação e detêm vastas quantidades de dados pessoais. Ao priorizar conteúdos que aumentam o tempo de engajamento e maximizar a coleta de dados, as plataformas promovem um ambiente digital onde o controle sobre a informação e a atenção dos usuários se torna o ativo mais valioso.
A hegemonia algorítmica tem profundas implicações políticas e sociais. Ao modular as interações e os debates públicos, os algoritmos moldam o espaço público digital de forma que favorece certas vozes e narrativas em detrimento de outras. O’Neil (2016) adverte que essa modulação cria um ambiente de desigualdade informacional, onde a visibilidade de certos conteúdos está diretamente ligada à lógica comercial das plataformas. Isso limita a diversidade de vozes e restringe o debate público a conteúdos que são considerados lucrativos ou engajantes pelas plataformas, enquanto marginaliza discursos que poderiam desafiar o status quo ou oferecer alternativas.
Além disso, o impacto da modulação algorítmica na autonomia dos indivíduos é outro ponto crítico. Silveira (2019) argumenta que, ao controlar o fluxo de informações e personalizar a experiência de cada usuário, os algoritmos reduzem a capacidade dos indivíduos de tomar decisões informadas e de interagir de maneira crítica com o mundo digital. Ao invisibilizar certos conteúdos e amplificar outros, os algoritmos acabam moldando as percepções de realidade dos usuários, criando uma hegemonia que opera não pela coerção explícita, mas pela manipulação sutil dos comportamentos e interações.
A modulação algorítmica, conforme discutido por autores como Silveira (2019), Cassino (2021) e O’Neil (2016), revela-se como uma forma central de hegemonia digital na era contemporânea. Essa forma de controle, baseada na personalização invisível das experiências dos usuários, reforça o poder das plataformas digitais, que, ao controlar os fluxos de atenção e os debates públicos, moldam a sociedade de acordo com seus interesses comerciais. A hegemonia algorítmica redefine as noções de controle e poder ao operar de forma descentralizada e insidiosa, criando novas formas de dominação que demandam uma análise crítica e uma resposta regulatória que promova a transparência e a diversidade informacional.
Plataformas Digitais como Dispositivos de Hegemonia
As plataformas digitais têm se consolidado como dispositivos centrais de hegemonia na era contemporânea, exercendo um controle que vai além das fronteiras tradicionais da mídia de massa. Bucher (2018) argumenta que os algoritmos, centrais no funcionamento dessas plataformas, operam como mecanismos de governamentalidade, conceito foucaultiano que descreve como o poder é exercido através da regulação do comportamento individual e social. No contexto das plataformas digitais, essa governabilidade se manifesta por meio de algoritmos que, de maneira invisível e insidiosa, regulam a participação e moldam as interações dos usuários. O poder que esses algoritmos exercem não é coercitivo no sentido tradicional; em vez disso, ele é exercido de forma sutil e preditiva, moldando comportamentos a partir da análise de grandes volumes de dados e direcionando os usuários para conteúdos que maximizem o tempo de permanência e engajamento nas plataformas.
Essa lógica está alinhada com o conceito de plataformização descrito por Van Dijck et al. (2018). A plataformização implica uma reorganização profunda das esferas sociais, culturais e econômicas, onde as plataformas digitais não apenas mediam as interações, mas também as estruturam. Elas agem como intermediárias e controladoras dos fluxos de informação, moldando o que é visto, compartilhado e discutido no espaço público digital. Nesse sentido, o conceito gramsciano de hegemonia encontra uma atualização significativa: enquanto Gramsci (1971) via a hegemonia como o controle cultural e ideológico exercido por instituições tradicionais, na era digital esse controle é mediado e amplificado pelos algoritmos, que produzem e sustentam narrativas dominantes de maneira automática e invisível.
A análise de Bucher (2018) sobre a governamentalidade algorítmica oferece uma perspectiva crítica sobre como o poder é descentralizado e automatizado nas plataformas digitais. Diferente da hegemonia tradicional, que dependia de mecanismos mais explícitos de controle cultural e ideológico, as plataformas digitais exercem uma hegemonia implícita, na qual o comportamento dos usuários é moldado por algoritmos sem que eles percebam ativamente o impacto dessas escolhas. A governamentalidade algorítmica regula não apenas o conteúdo que os usuários consomem, mas também os limites de sua participação, incentivando certos tipos de interação (como curtidas, compartilhamentos ou comentários) e desincentivando outros, menos lucrativos ou menos alinhados com os interesses das plataformas.
Nesse sentido, o poder hegemônico das plataformas digitais é amplificado pela modulação algorítmica descrita por Silveira (2019) e Cassino (2021), onde as interações sociais são continuamente ajustadas e moduladas para favorecer determinados comportamentos e narrativas. As plataformas, ao modular a experiência digital dos usuários, exercem uma hegemonia comercial e ideológica que vai além da simples mediação de conteúdos, transformando os próprios usuários em produtores de dados que reforçam o poder econômico dessas corporações.
Van Dijck et al. (2018) argumentam que o processo de plataformização é caracterizado pela capacidade das plataformas digitais de se inserirem em diversas esferas da vida cotidiana - do entretenimento à comunicação pessoal, da política à economia -, tornando-se infraestruturas fundamentais para a organização dessas interações. Nesse cenário, as plataformas não são mais meros facilitadores de trocas ou mediadores passivos, mas agentes ativos que moldam a estrutura e o conteúdo dessas interações. Essa capacidade de moldar a vida social a partir de mecanismos algorítmicos de controle representa uma mudança significativa nas dinâmicas de poder, e Srnicek (2016) vê essas plataformas como as novas infraestruturas de poder na economia digital.
Para Srnicek (2016), as plataformas não apenas facilitam o fluxo de dados e a comunicação, mas também controlam esses fluxos, decidindo o que é visível e o que é oculto, o que é amplificado e o que é marginalizado. Esse controle algorítmico transforma as plataformas em atores hegemônicos que reconfiguram as dinâmicas de poder, estabelecendo novas formas de dominação que substituem, ou ao menos complementam, as formas tradicionais de controle midiático. Se, na era da mídia de massa, o poder se concentrava em poucas emissoras de TV, jornais ou estações de rádio, hoje o poder está centralizado nas mãos de grandes corporações digitais que controlam as plataformas mais acessadas, como Facebook, Google, Amazon e YouTube.
Essas plataformas exercem uma dupla hegemonia: uma de controle sobre o conteúdo, decidindo quais narrativas ganham visibilidade e quais são invisibilizadas, e outra de controle sobre os dados, explorando as interações dos usuários para fins comerciais. O poder que essas plataformas detêm não se refere apenas à visibilidade ou invisibilidade de certas narrativas, mas também ao seu controle econômico sobre os dados dos usuários, que são constantemente extraídos e monetizados. Nesse sentido, a plataformização se configura como uma forma de acumulação por despossessão, conforme descrito por Harvey (2005), em que o valor econômico é gerado pela apropriação de dados pessoais e comportamentais dos usuários.
A hegemonia exercida pelas plataformas digitais, portanto, é uma hegemonia comercial e algorítmica. Como Zuboff (2019) aponta em sua análise do capitalismo de vigilância, as plataformas digitais são projetadas para extrair dados de todas as interações dos usuários e transformá-los em ativos comerciais. Esse processo implica um duplo controle: enquanto os algoritmos moldam as interações dos usuários e os mantém engajados por meio de personalização, as plataformas coletam e monetizam esses dados, estabelecendo um ciclo contínuo de controle e extração de valor.
Esse poder comercial das plataformas também tem implicações profundas para a política e a democracia. As plataformas digitais não apenas moldam o consumo de informações, mas também reconfiguram os próprios limites do debate público, uma vez que as narrativas dominantes são frequentemente alinhadas com os interesses das grandes corporações que controlam esses espaços, como aponta Jesus-Silva (2024). Nesse sentido, a hegemonia algorítmica se manifesta na construção de um consenso comercial, onde o conteúdo que gera maior engajamento e valor econômico é priorizado, enquanto discursos que desafiam esse modelo são frequentemente marginalizados ou invisibilizados.
As plataformas digitais, como apontado por Bucher (2018), Van Dijck et al. (2018) e Srnicek (2016), atuam como dispositivos hegemônicos que controlam o fluxo de dados e informações de maneiras que reconfiguram o poder na era digital. Ao operar como infraestruturas que regulam e moldam as interações sociais, culturais e econômicas, essas plataformas exercem uma hegemonia algorítmica, na qual o controle se dá por meio da modulação invisível de comportamentos e da organização dos espaços discursivos.
A análise crítica desse fenômeno revela que o poder das plataformas não se restringe à mediação de conteúdos, mas também à produção e sustentação de narrativas dominantes, que favorecem interesses comerciais e econômicos. Isso sugere que a hegemonia algorítmica, como forma de dominação contemporânea, exige uma resposta crítica que não apenas compreenda as dinâmicas desse novo poder, mas que também busque formas de resistência e regulamentação, promovendo maior transparência algorítmica e garantindo que o debate público digital seja mais democrático e pluralista.
O Príncipe Algorítmico e a Psicopolítica
O conceito de príncipe algorítmico, retomado por Seto (2024, pp. 107-108), propõe uma reflexão sobre como os algoritmos se tornaram os novos governantes invisíveis das sociedades contemporâneas, e que “operam como uma ‘polícia discursiva’, como falava Foucault, que filtra os discursos, distribuindo alguns e impedindo a circulação de outros, favorecendo, portanto, o crescimento da centralidade de rede e das audiências de alguns atores e agenciamentos políticos”. Esses algoritmos, que operam de maneira preditiva e invisível, exercem um controle sobre os indivíduos que transcende a simples vigilância: eles modulam comportamentos, desejos e decisões, criando um ambiente de controle que não depende mais da coerção direta, mas de uma influência sutil e quase imperceptível. Nessa dinâmica, o poder não se apresenta como uma força repressiva, mas como uma influência que molda as ações dos indivíduos em um nível pré-reflexivo e inconsciente, o que Han (2018) identifica como um novo tipo de psicopolítica.
A psicopolítica, tal como descrita por Han (2018), representa uma forma contemporânea de controle que opera diretamente sobre a psique dos indivíduos, utilizando as ferramentas digitais para prever, moldar e modular os comportamentos e desejos humanos. Enquanto o poder disciplinar, conforme descrito por Foucault (1975), se exercia sobre os corpos por meio de instituições visíveis e normas sociais, a psicopolítica algorítmica atua diretamente sobre a mente e a subjetividade, transformando o próprio indivíduo em um agente de autocontrole, guiado por algoritmos que influenciam suas escolhas e decisões sem que ele perceba. Nesse sentido, o príncipe algorítmico não é uma figura de autoridade explícita, mas um sistema invisível e disseminado que exerce seu poder através da modulação dos fluxos de atenção e conexão.
Rouvroy e Berns (2018) aprofundam essa análise ao descrever o processo de modulação algorítmica como uma reorganização dos fluxos de atenção e das interações sociais nas plataformas digitais. As redes sociais digitais, motores de busca e plataformas de comércio eletrônico utilizam algoritmos para prever e influenciar as ações dos usuários, baseando-se em grandes volumes de dados coletados a partir de suas atividades on-line. Essa modulação algorítmica funciona como uma espécie de profecia autorrealizadora, na qual as ações dos indivíduos são moldadas consoante as previsões dos sistemas algorítmicos, que, por sua vez, são refinados a partir do comportamento passado. Isso cria um ciclo fechado em que o indivíduo acredita estar fazendo escolhas livres, quando, na verdade, suas decisões são antecipadas e guiadas pelos algoritmos que controlam as plataformas.
Essa dinâmica é especialmente perigosa porque neutraliza a capacidade de resistência e questionamento dos indivíduos. Ao influenciar as preferências e as decisões dos usuários de forma sutil, o príncipe algorítmico mantém o controle sem nunca precisar se revelar como uma força coercitiva. O indivíduo acredita que suas escolhas são autônomas, quando, na verdade, estão sendo moldadas por sistemas algorítmicos que têm interesses econômicos e comerciais específicos. Como argumenta Han (2018), a psicopolítica algorítmica trabalha na produção de desejos, formando subjetividades que se alinham automaticamente aos interesses das grandes corporações que controlam as plataformas digitais.
As análises de Han (2018) e Doneda e Almeida (2018) se complementam com a crítica ao capitalismo de vigilância feita por Zuboff (2019), que vê as plataformas digitais como infraestruturas de controle que não apenas vigiam, mas moldam comportamentos em escala global. Ao utilizar dados comportamentais para prever e influenciar as ações dos usuários, as plataformas operam em um sistema de modulação contínua, onde a vigilância não serve apenas para monitorar, mas para influenciar diretamente as decisões e comportamentos humanos. Nesse contexto, o controle psicopolítico descrito por Han (2018) se manifesta como uma forma de vigilância que atua diretamente sobre a subjetividade, moldando os desejos e as necessidades dos indivíduos conforme as expectativas e interesses das plataformas.
O conceito de profecia autorrealizadora mencionado por Rouvroy e Berns (2018) também encontra eco nas análises de Zuboff (2019), que descreve como as plataformas utilizam algoritmos para prever comportamentos futuros e, em seguida, moldá-los de acordo com essas previsões. Esse ciclo de retroalimentação cria um ambiente de controle total, onde as escolhas dos usuários são cada vez mais restringidas às opções que os algoritmos preveem como prováveis. Nesse sentido, o príncipe algorítmico não apenas observa o comportamento dos indivíduos, mas modela ativamente o espaço dentro do qual eles operam, eliminando a possibilidade de escolhas verdadeiramente autônomas.
Essa perspectiva revela uma erosão da autonomia individual, essencial para a noção de liberdade em uma sociedade democrática. Ao transformar a subjetividade em um produto a ser modelado e explorado, a psicopolítica algorítmica cria uma forma de controle muito mais difícil de ser percebida e contestada. Han (2018) argumenta que essa forma de controle invisível é ainda mais eficiente do que os métodos tradicionais de vigilância, pois o indivíduo não sente que está sendo vigiado e controlado - ele acredita estar agindo de acordo com seus próprios interesses e desejos, sem perceber que esses mesmos desejos foram moldados pelas plataformas digitais.
Essa nova forma de hegemonia, que opera através da psicopolítica algorítmica, desafia as noções tradicionais de liberdade e autonomia individual, levantando questões cruciais sobre o papel das plataformas digitais na formação de subjetividades e na manutenção do poder nas sociedades digitais. A crítica a esse sistema exige uma compreensão profunda das dinâmicas de poder envolvidas e a busca por alternativas que garantam maior transparência e autonomia frente ao controle invisível exercido pelo príncipe algorítmico.
Mudança Qualitativa das Condições de Hegemonia
A hegemonia algorítmica representa uma transformação profunda e qualitativa nas dinâmicas de poder contemporâneas. O conceito de hegemonia, originalmente formulado por Gramsci (1971), referia-se ao domínio cultural e ideológico exercido por uma classe dominante, que moldava a percepção das massas ao promover suas ideias e interesses como universais. No entanto, na era digital, esse conceito evoluiu, adquirindo novas formas e métodos de controle, profundamente influenciados pela lógica dos algoritmos e das redes digitais.
Galloway (2004) propõe uma compreensão desse novo poder no contexto das redes digitais, onde o controle não é exercido de maneira direta ou coercitiva, mas através da organização de padrões e protocolos que governam o comportamento de forma imperceptível. O poder algorítmico não se baseia mais na imposição explícita de normas ou na repressão física, mas na capacidade de modular e organizar as condições sob as quais os indivíduos interagem com a informação e entre si. Dessa forma, a hegemonia não se manifesta na tradicional concentração de poder sobre as massas, mas na criação de estruturas invisíveis que regulam as interações sociais e culturais.
Por sua vez, Ferrari e Graham (2021) consideram o poder algorítmico como a capacidade que os algoritmos têm de governar e influenciar as interações e comportamentos dos trabalhadores e consumidores nas plataformas digitais. Esse poder se manifesta de duas maneiras principais: de forma discursiva e material. A dimensão discursiva refere-se à maneira como as plataformas utilizam narrativas e discursos para moldar a percepção dos usuários sobre o que é aceitável ou desejável. Isso inclui como se apresentam como mediadores neutros e eficientes, enquanto, na prática, exercem controle sobre as dinâmicas de trabalho e interação.
O que Galloway (2004) chama de “protocolo” é, na realidade, a infraestrutura técnica subjacente às redes digitais, que estabelece os parâmetros de comunicação e interação. Esses protocolos definem as regras do jogo digital: quais conteúdos serão promovidos, quais interações serão encorajadas e quais usuários serão mais visíveis. A modulação dessas interações, operada pelos algoritmos, molda as experiências cotidianas sem que os indivíduos estejam cientes de como essas regras operam, reforçando um sistema de controle discreto, mas altamente eficaz.
Couldry e Mejias (2019) aprofundam essa discussão ao argumentar que a hegemonia algorítmica é qualitativa em vez de quantitativa. Eles afirmam que, diferentemente das formas anteriores de hegemonia, que buscavam concentrar poder diretamente através da imposição de ideologias dominantes, o poder algorítmico é exercido pela modulação das condições de interação. Ou seja, as plataformas digitais não apenas concentram poder no sentido tradicional, mas moldam o terreno das interações sociais.
Os algoritmos, nesse novo cenário, são os arquitetos invisíveis que determinam quais narrativas ganham visibilidade e quais são marginalizadas. Eles fazem isso ao organizar a circulação da informação de acordo com lógicas comerciais e políticas que favorecem certos interesses. Por exemplo, as plataformas digitais como YouTube e Facebook priorizam conteúdos que geram maior engajamento emocional, o que muitas vezes significa que narrativas polarizadoras, sensacionalistas ou desinformativas são amplificadas, enquanto conteúdos que desafiam o status quo ou promovem debates mais complexos são relegados a espaços de menor visibilidade.
Esse processo não é uma simples concentração de poder sobre os dados ou a coleta de grandes volumes de informações pessoais, mas a redefinição das condições estruturais sobre as quais o poder opera. Conforme Couldry e Mejias (2019) destacam, o objetivo do poder algorítmico não é apenas monitorar as ações dos indivíduos, mas moldar a infraestrutura da própria vida social. Isso significa que o poder está na capacidade de modular o ambiente em que a interação social ocorre, determinando quem pode falar, o que pode ser dito e quem será ouvido.
Essa mudança qualitativa nas condições de hegemonia pode ser vista de maneira crítica através do conceito de modulação, conforme descrito por Galloway (2004). A modulação é um processo contínuo de ajuste e refinamento das interações, em que os algoritmos não impõem limites rígidos ou proibições, mas ajustam os comportamentos dos indivíduos ao longo do tempo, de acordo com objetivos predefinidos. Deleuze (1992) já discutia essa ideia ao introduzir o conceito de sociedade de controle, no qual o poder não se baseia mais em uma disciplina rígida e estática, mas em um controle fluido e adaptativo, que se ajusta continuamente às circunstâncias.
Na era digital, esse controle adaptativo é realizado pelos algoritmos que ajustam o fluxo de informações com base em métricas de engajamento, lucratividade e previsibilidade de comportamento. Essa capacidade de ajustar as interações com base em dados comportamentais em tempo real significa que o poder algorítmico não precisa ser visível para ser eficaz. Pelo contrário, sua força reside precisamente na invisibilidade e na naturalização de suas operações, criando uma hegemonia onde os indivíduos são levados a acreditar que estão tomando decisões livres, quando, na verdade, suas interações estão sendo moduladas por sistemas invisíveis de controle.
Essa modulação qualitativa das interações sociais e culturais apresenta um desafio significativo para a resistência. Se, nas formas tradicionais de hegemonia, a resistência poderia se manifestar pela criação de contranarrativas ou pela organização de movimentos sociais que desafiam diretamente a estrutura dominante, no caso da hegemonia algorítmica a resistência torna-se mais complexa. Isso se deve ao fato de que os algoritmos operam de maneira oculta, ajustando as condições de interação sem que os indivíduos estejam plenamente conscientes de como suas escolhas estão sendo moduladas.
Além disso, a natureza psicopolítica desse controle, como argumenta Han (2018), sugere que o poder algorítmico opera em um nível pré-reflexivo, moldando os desejos e necessidades dos indivíduos antes mesmo que eles possam articular uma resistência consciente. Os algoritmos não apenas direcionam o comportamento, mas também moldam os próprios desejos e preferências dos usuários, tornando mais difícil a mobilização de uma crítica eficaz. A hegemonia, nesse sentido, não é apenas uma questão de controle externo, mas de uma interiorização das normas algorítmicas, que moldam a maneira como os indivíduos percebem o mundo e agem dentro dele.
Uma crítica central à hegemonia algorítmica reside na sua capacidade de naturalizar o controle. A modulação contínua das interações e a invisibilidade dos mecanismos de controle criam um ambiente em que os indivíduos aceitam as condições impostas pelos algoritmos como naturais e inevitáveis. Essa naturalização do poder algorítmico é perigosa porque minimiza o questionamento crítico das operações das plataformas digitais e obscurece as relações de poder que estão em jogo. Srnicek (2016) aponta que as plataformas digitais, ao naturalizarem sua posição como intermediárias essenciais da vida cotidiana, consolidam seu poder de forma que parece incontestável.
Nesse sentido, o desafio da resistência à hegemonia algorítmica deve passar pela desnaturalização do poder algorítmico, ou seja, pela exposição dos mecanismos invisíveis de controle que estruturam as interações sociais. Isso pode incluir a demanda por transparência algorítmica, a criação de regulamentos que limitem a capacidade das plataformas de operar sem supervisão, e a promoção de uma maior conscientização pública sobre como os algoritmos moldam as escolhas e as interações dos indivíduos.
A hegemonia algorítmica, como discutida por Galloway (2004), Couldry e Mejias (2019) e Srnicek (2016), representa uma mudança qualitativa nas condições de poder nas sociedades contemporâneas. Esse novo poder não se baseia na imposição direta ou na repressão física, mas na modulação invisível das interações e dos fluxos de informação. Os algoritmos organizam as condições de interação de maneira que moldam as escolhas e percepções dos indivíduos, criando uma hegemonia que opera sem ser percebida.
Essa transformação qualitativa apresenta novos desafios para a resistência e a crítica, uma vez que o poder algorítmico atua de maneira discreta e pré-reflexiva, naturalizando seu controle sobre os indivíduos. Para contestar essa hegemonia, é necessário expor os mecanismos invisíveis de controle e desnaturalizar o poder que os algoritmos exercem sobre a vida cotidiana, promovendo uma crítica mais profunda sobre a relação entre tecnologia, poder e autonomia na era digital.
Considerações Finais
O estudo sobre a hegemonia algorítmica revela uma profunda reconfiguração das formas de poder nas sociedades digitais contemporâneas. Ao analisar o papel dos algoritmos na organização e modulação dos fluxos de informação, ficou evidente que as plataformas digitais exercem um controle invisível sobre as interações sociais, moldando comportamentos e influenciando decisões em um nível pré-reflexivo. Esse novo modelo de poder, conforme apontado por autores como Gramsci (1971), Deleuze (1992) e Lyon (2014), caracteriza-se pela capacidade de operar de forma automatizada e descentralizada, criando um ambiente em que os indivíduos acreditam estar agindo de maneira autônoma, quando, na verdade, suas ações são moldadas por sistemas algorítmicos que favorecem interesses comerciais.
A hegemonia algorítmica, ao controlar a visibilidade de certos discursos e marginalizar outros, levanta importantes questões sobre a diversidade de vozes no espaço público e a centralização do poder informacional nas mãos de grandes corporações. Essa dinâmica ameaça a autonomia dos indivíduos e a equidade no acesso à informação, consolidando uma estrutura de controle que reforça o status quo e limita a emergência de narrativas alternativas.
A análise apresentada ao longo deste estudo revela que a hegemonia algorítmica representa uma mudança qualitativa nas formas de controle exercidas nas sociedades digitais contemporâneas. Diferente dos modelos tradicionais de poder, baseados na imposição direta de normas e ideologias, o poder algorítmico se manifesta por meio da modulação invisível das interações e dos fluxos de informação. Mediante plataformas digitais, os algoritmos organizam o espaço público para controlar a visibilidade das narrativas, promovendo aquelas que se alinham com interesses comerciais e limitando outras que poderiam desafiar o status quo.
Esta forma de controle, conforme discutido por autores como Galloway (2004), Couldry e Mejias (2019) e Srnicek (2016), não apenas reorganiza o debate público, mas também molda as subjetividades dos indivíduos, influenciando comportamentos e decisões de maneira preditiva. A capacidade dos algoritmos de determinar o que será visto e amplificado gera uma desigualdade informacional, onde certos conteúdos são priorizados de acordo com critérios comerciais, enquanto vozes alternativas ou críticas são marginalizadas.
Portanto, é crucial que se promova uma crítica mais profunda e uma regulação mais eficaz sobre as operações desses algoritmos, garantindo maior transparência e justiça no ambiente digital. Somente assim será possível construir uma esfera pública mais democrática e plural, onde o controle sobre a informação seja distribuído de maneira mais equitativa, e onde os indivíduos possam exercer suas liberdades de maneira consciente e autônoma, sem serem subjugados pela lógica invisível do príncipe algorítmico.
Resumo
Main Text
O Conceito de Hegemonia Algorítmica
Modulação Algorítmica como Hegemonia
Plataformas Digitais como Dispositivos de Hegemonia
O Príncipe Algorítmico e a Psicopolítica
Mudança Qualitativa das Condições de Hegemonia
Considerações Finais