Viver nas “periferias desqualificadas”: do que diz a literatura às percepções de interventores comunitários. Living in "relegated peripheries": from what the literature says to the representations of community workers
DOI:
https://doi.org/10.11606/w67mze98Palavras-chave:
espaço urbano, periferia, bairro social, impacto psicológico, intervenção comunitáriaResumo
As cidades são dotadas duma dinâmica incessante, produzindo constante transformação socioespacial que dificulta a sua legibilidade pelos múltiplos especialistas do fenómeno urbano. A “periferia desqualificada” é um espaço privilegiado para a análise deste processo, e é sobre ele que faremos um exercício analítico que dividimos em duas partes. Na primeira interrogamos a periferia enquanto categoria classificatória duma realidade socioespacial: que entidade queremos nomear quando dizemos “periferia”? Partindo da revisão de literatura sobre diferentes geografias da periferia, esboçamos linhas de resposta a estas questões.
Na segunda parte expomos dados duma investigação em curso sobre o impacto psicológico da “periferia desqualificada”, em que exploramos as perceções de técnicos de intervenção comunitária com longa trajetória laboral com populações periferizadas da cidade do Porto. O objetivo principal é o de conhecer de que modo (re)constroem a categoria aqui em análise em torno de descritores psicológicos e sociais daquilo que percecionam como o seu impacto sobre os habitantes. Salientam-se nos resultados as referências à periferia como distância, mesmo quando espacialmente ela é pouco significativa, como ausência e como fechamento; mas também como vivência marcada por forte territorialização a que estão associadas uma identidade de lugar e sentimentos de pertença sintetizados na expressão local “bairrismo”.
The cities have a never-ending dynamism, one which constantly produces social and spatial changes and thereby makes them difficult for urban analysts to interpret. The "relegated peripheries" are privileged areas for analyzing this process, on which we are going to conduct an analytical exercise divided in two stages. In the first stage we interrogate the periphery as a category of a social and spatial reality: what is the entity we intend to designate when we say "periphery"? We outline an answer to these questions based on a literature review of different geographies of the peripheries.
Then, on the second stage, we present data from an ongoing research on the psychological impact of the "relegated periphery". Here we explore the representations of community workers with large experience in dealing with people who inhabit the peripheries in the city of Porto. The main goal is to learn how they (re)construct the "relegated periphery" around its social and psychological impacts on its inhabitants. Results show that periphery is understood as a distance, even if it is not so in strictly geographical terms, as an absence and a closure. Also, those peripheries are strongly territorialized, highly associated with an identity of place, and feelings of belonging that can be summed up in the local expression "bairrismo" (which can be translated as a positive parochialism).
Referências
ARABINDOO, Pushpa. 2009. “Falling Apart at the Margins? Neighbourhood Transformations in Peri-Urban Chennai”. Development and Change n. 40 (5): 879-901
DOI : 10.1111/j.1467-7660.2009.01587.x
BASTEN, Ludger. 2003. “Percepcions of Urban Space in The Periphery: Potsdam’s Kirchsteigfeld”. Tijdschriftvoor Economischeen Sociale Geografie n.1 (95): 89–99
BOURDIEU, Pierre. 2007. A miséria do mundo. Petrópolis: Editora Vozes
CARDOSO, Vasco. 2010. A morfologia da habitação social no Porto após o Plano de Melhoramentos: rutura ou continuidade? Actas do XII Colóquio Ibérico de Geografia, Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto
CAZELOTO, Edilson. 2008. Inclusão digital: uma visão crítica. São Paulo: SENAC
CHAMPAGNE, Patrick. 1991. “La construction médiatique des “malaises sociaux”. Actes de la Recherche en Sciences Sociales n. 90: 64-75
COSTA, Pedro & MOREIRA, Paulo. 2013. “Noutra Costa da Caparica”. Jornal dos Arquitectos n. 247: 88-99
DUBET, Françoise & LAPEYRONNIE, Didier. 1992. Les Quartiers d’Exil. Paris: Èditions du Seuil
DOI : 10.3917/lsrel.dubet.1992.01
DONZELOT, Jacques. 2006. Quand la ville se défait. Quelle politique face à la crise des banlieues. Paris: Seuil
ENNE, Ana. 2002. Lugar meu amigo, é a minha Baixada”: Memória, representações sociais e identidades. Rio de Janeiro: Dissertação de Doutoramento, PPGAS/Museu Nacional/UFRJ
FERNANDES, Luís & AGRA, Cândido. 1991. Uma topografia urbana das drogas. Lisboa: Gabinete de Planeamento e Coordenação do Combate à Droga
FERNANDES, Luís. 1998. O sítio das drogas. Lisboa: Editorial Notícias
DOI : 10.4000/books.etnograficapress.7245
FERNANDES, Luís. 2001. Criminogénese e perigosidade nos bairros sociais degradados: problematizações. Temas Penitenciários série II n. 6, 7 : 9-14
FERNANDES, L. & NEVES, T. 2002. “Ethnographic space-time: culture of resistance in a “dangerous place”. In: S. Brochu, C. Agra & M. Cousineau (eds.), Drugs and crime deviant pathways. Hampshire: Ashgate Editions
FERNANDES, Luís & PINTO, Marta. 2004. “El espacio urbano como dispositivo de control social: territorios psicotrópicos y políticas de la ciudad”. Monografías Humanitas n.5: 147-162
FERNANDES, Luís. 2006. “Figuras da vitimação colectiva”. Revista Europeia de Reabilitação e Inserção Social 1 (1): 57-78
FERNANDES, Luís & RAMOS, Alexandra. 2010. “Exclusão social e violências quotidianas em “bairros degradados”: etnografia das drogas numa periferia urbana”. Toxicodependências n.16 (2): 15-29
GALINDO, Carlos & DELGADO, Javier. 2006. “Los Espacios Emergentes de la Dinámica Rural-Urbana”. Desarollo, n. 147 (37): 187-216
HERRERA, Patricio. 2008. “Dessarrollos Urbanos e Inverciones Turísticas Costeiras”. Revista Urbano, 18, pp. 16-23
IANOS, Ioan, SIRODOEV, Igor, PASCARIU, Gabriel. 2012. “Build-up space dynamics complicates the present-day urban land use in Bucharest”. Analele Universitattidin Oradea – Seria Geografie n.1: 48-53
LE MARCIS, Frédéric. 2004. “The suffering body of the city”. Public Culture, n. 16 (3): 453-477
DOI : 10.1215/08992363-16-3-453
MALHEIROS, Jorge & MENDES, Manuela. 2007. Espaços e Expressões de Conflito e Tensão entre Autóctones, Minorias Migrantes e Não Migrantes na Área Metropolitana de Lisboa. Lisboa: Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME)
MENEGAT, Elizete. 2005. “Crise urbana na atualidade: indagações a partir do fenômeno da concentração espacial dos pobres em assentamentos ilegais”. In: Grupo de Trabajo Desarrollo Urbano del Consejo Latinoamericano de CienciasSociales (CLACSO) (eds.), Outro desarrollo urbano: ciudad incluyente, justicia social y gestión democrática.
MESSIANT, C. 1989. “Luanda: 1945-1961”. In: M. Cahen (ed), Bourgs et villes en Afrique Lusophone . Paris: Editions L’Harmattan, pp. 125 – 199
PAUGAN, Serge. 2003. A desqualificação social – ensaio sobre a nova pobreza. Porto: Porto Editora
PEREIRA, Virgílio Borges & QUEIRÓS, João. 2009. “Estado, Alojamento e a «Questão Social»: elementos para a compreensão sociológica da formação da respectiva relação no Porto contemporâneo”. Argumentos de Razón Técnica – Revista Española de Ciencia, Tecnología y Sociedad, y Filosofía de la Tecnología (serie especial), n. 2: 113-128
PEREIRA, Maria e BRITO, M. 2006. “Desemprego e subjetividade no contexto brasileiro: uma análise interpretativa sob a ótica dos excluídos do mercado de trabalho industrial”. Revista Mal Estar e Subjetividade, n. 1 (6), pp. 143-181
QUEIRÓS, João. 2011. “A periferia no centro. Sobre a invisibilização das classes populares e a experiência da relegação urbana”. Le Monde Diplomatique, II Série, n. 53
RÊGO, Ximene e FERNANDES, Luís. 2012. “As falas do medo: convergências entre as cidades do Porto e Rio de Janeiro”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, n. 27 (78), pp. 51-65
DOI : 10.1590/S0102-69092012000100004
ROQUE, Sandra. 2011. “Cidade and Bairro: classification, constitution and experience of urban space in Angola”. Social Dynamics, n. 3 (37): 332-348
RUI, Taniele. 2012. Corpos abjetos: etnografia em cenários de uso e comércio de crack. Campinas: Dissertação de Doutoramento em Antropologia Social, Universidade Estadual de Campinas
SANTOS, Boaventura. 1985. “Estado e sociedade na semiperiferia do sistema mundial: o caso português”. Análise Social vol. 21: 869-901
PEREIRA, Alvaro. 2012. “Reflexões sobre o fenômeno da “centralidade” a partir do quadro teórico da “Antropologia da Cidade”. Ponto Urbe n. 11
DOI : 10.4000/pontourbe.1075
SCHINGARO, Nicola. 2014. “The reversal of lifelong labeling: an autoethnography”. Deviant Behaviour n. 35: 703-726
DOI : 10.1080/01639625.2013.878578
TENÓRIO, Fernando. 2007. Tecnologia da informação transformando as organizações e o trabalho. Rio de Janeiro: Editora FGV
TISSOT, Sylvie & POUPEAU, Franck. 2005. La spatialisation des problèmes sociaux. Actes de la recherche en sciences sociales, n. 159: 5-9
DOI : 10.3917/arss.159.0004
VENTURA, Zuenir. 1994. Cidade Partida. São Paulo: Companhia das Letras
WACQUANT, Loic. 2001. Os condenados da cidade: estudos sobre marginalidade avançada. Rio de Janeiro: Editora Revan
WACQUANT, Loic. 2006. Parias Urbains – Ghetto, banlieues, État. Paris: La Découverte
WALLERSTEIN, Immanuel. 1984. The Politics of the World-Economy. The States, the Movements and the Civilizations. Cambridge: Cambridge UniversityPress
WILLIAMS, A. 1980. “Conservation planning in Oporto – na integrated approach in the Ribeira-Barredo”. Town Planning Review n. 51: 177-194
Downloads
Publicado
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2015 Luís Fernandes, Simão Mata
![Creative Commons License](http://i.creativecommons.org/l/by-nc-sa/4.0/88x31.png)
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International License.