Inteligência Artificial no Monitoramento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)

Autores

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v103i6e-233051

Palavras-chave:

Inteligência Artificial, Monitoramento, Unidade de Terapia Intensiva (UTI)

Resumo

Inteligência Artificial no Monitoramento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)

 

  1. Qual o avanço da inteligência artificial na UTI?

A busca pelo conhecimento em prol dos avanços no cuidado ao paciente crítico, adoção de estratégias inovadoras e redefinição de padrões sempre estiveram presentes no dia a dia da terapia intensiva.

Em 1998, com a criação de um protocolo de proteção pulmonar para pacientes que desenvolvem a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) é um dos exemplos transformadores na busca da individualização e precisão terapêutica.  Este estudo (Effect of a Protective-Ventilation Strategy on Mortality in the Acute Respiratory Distress Syndrome - NEJM), realizado no HCFMUSP, demonstrou ao mundo que a estratégia protetora de ventilação mecânica foi responsável por diminuir pela metade os óbitos desses pacientes em UTI.1

 Em 2015, um outro trabalho do grupo de pesquisadores da UTI Respiratória HC FMUSP (Driving Pressure and Survival in the Acute Respiratory Distress Syndrome - NEJM) instrumentalizou a estratégia de ventilação protetora e, portanto, além de individualizar a mecânica ventilatória, foi possível ajustar a terapia conforme a evolução do pulmão, ajuste dinâmico ao momento fisiológico do paciente.2

Estes exemplos, bem como os inúmeros esforços dos últimos 20 anos relatam que o cuidado individualizado e sua relação temporal estão diretamente relacionados ao sucesso na terapia intensiva.

O monitoramento contínuo de eletrocardiografia (ECG), associado aos sinais vitais medidos intermitentemente e resultados laboratoriais armazenados em registros médicos eletrônicos, é usado para detecção precoce da deterioração clínica em pacientes de graves.3

Um estudo multicêntrico com população mista de enfermaria e UTI, validou um algoritmo baseado no aprendizado de máquinas (InSight) para a detecção e previsão de sepse, sepse grave e choque séptico com alta sensibilidade e especificidade. A análise de apenas seis sinais vitais comuns (pressão arterial sistólica, pressão arterial diastólica, frequência cardíaca, frequência respiratória, saturação de oxigênio capilar periférico e temperatura), retirados dos registros eletrônicos hospitalares, apresentou excelentes resultados, podendo ser uma opção de baixo custo para novos usuários.4 

  Os dados armazenados dos registros médicos podem ser utilizados para a condução de estudos retrospectivos para melhorar as ferramentas de aprendizado das máquinas e aumentar a qualidade do uso. Conforme este estudo conduzido em um centro acadêmico de cuidados terciários, conseguiu-se prever alterações fisiológicas em até 24 horas antes da detecção clínica, podendo ser utilizadas precocemente através de máquinas antes da deterioração.5

O controle da ventilação mecânica tem um papel fundamental na sobrevida do paciente crítico em UTI. Por outro lado, o quão antes for percebida uma assincronia ventilatória, maiores as chances de evitar lesões pulmonares pela própria terapia e, com isso, mitigar a possibilidade de complicação infecciosa.6

Em um estudo global, para definição dos critérios de consenso internacional para sepse pediátrica e choque séptico, o Phoenix Sepsis Score foi validado como uma potencial ferramenta em indivíduos menores de 18 anos com infecção, podendo melhorar o atendimento clínico, avaliação epidemiológica, identificação da sepse pediátrica e choque séptico em todo o mundo.7

A interpretação rápida dos dados obtidos por meio de escores SOFA, SAPS3, GLASGOW e KDIGO, por exemplo, é fundamental para a obtenção de metas hemodinâmicas adequadas e tratamento precoce dos pacientes críticos.8,9,10  Em atenção a tais demandas, cenários realísticos têm sido criados em UTIs para avaliar a precisão das ferramentas de inteligência artificial (como ChatGPT 4.0 Plus, Bard e Perplexity) na interpretação dos dados gerados pelos pacientes com a pontuação de score SOFA. O ChatGPT 4.0 Plus demonstrou um excelente desempenho, podendo ser uma ferramenta auxiliar na redução da sobrecarga de trabalho dos médicos.11

Outras áreas hospitalares também estão utilizando inteligência artificial em algoritmos de aprendizado de máquinas para a avaliação de imagens cardiovasculares na tomografia computadorizada. Essa ferramenta trabalha com dados armazenados, auxiliando no diagnóstico e prognóstico médico.12

Observamos um ritmo semelhante de evolução na angiotomografia computadorizada, amplamente utilizada para o diagnóstico da doença arterial coronariana e em fase final de validação para uso em pacientes. Em um futuro próximo, presume-se que a inteligência artificial estará totalmente integrada ao fluxo de trabalho hospitalar, reduzindo a sobrecarga de trabalho e transferindo o foco da medicina para a precisão no tratamento.13

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Biografia do Autor

  • Roberto de Souza Moreira, Universidade Federal de Catalão, Catalão, GO. Brasil.

    Possui graduação em Enfermagem pela Universidade Bandeirante de São Paulo (2001), Especialização em Cardiologia no INCOR pela Universidade de São Paulo (2003), Especialização em Nefrologia pela Universidade Federal de São Paulo (2007), Mestrado em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2013) e Doutorado em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2017). Pós doutorado em andamento na área de Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2019) e atualmente atuo como Professor Adjunto da Universidade Federal de Catalão.

  • Lucia Andrade, Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina, São Paulo, SP. Brasil.

    Professora Associada do Departamento de Clínica Médica/Nefrologia/LIM-12 e Chefe da UTI da Nefrologia do Hospital das Clínicas.

  • Cleidson Gomes, Instituto do Coração/HCFMUSP, São Paulo, SP. Brasil.

    Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (2007).  Atua como pesquisador em projetos de TIC, Telemedicina e biossensores em materiais 2D no IPq e no InCor-HC / FMUSP.

  • Marcelo Amato, Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina, São Paulo, SP. Brasil.

    Professor visitante e pesquisador associado da Universidade de Harvard Dr. Supervisor da UTI-Respiratória do Hospital das Clínicas e responsável pelo Laboratório de Investigação Médica LIM-09 - Pneumologia Experimental (Faculdade de Medicina da USP).

  • Carlos Carvalho, Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina, São Paulo, SP. Brasil.

    Professor Titular da Disciplina de Pneumologia do HC/FMUSP, consultor de desenvolvimento de equipamento - TIMPEL S/A e Diretor da Divisão de Pneumologia do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da FMUSP, onde chefia a UTI-Respiratória.

Referências

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Publicado

2025-02-14

Edição

Seção

Editorial

Como Citar

Moreira, R. de S. ., Andrade, L., Gomes, C. ., Amato, M. ., & Carvalho, C. . (2025). Inteligência Artificial no Monitoramento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Revista De Medicina, 103(6), e-233051. https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v103i6e-233051