Ecos dionisíacos em A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento: o diálogo implícito entre Nietzsche e Bakhtin

Resumo

Este artigo investiga a presença do pensamento de Friedrich Nietzsche na obra A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento, de Mikhail Bakhtin, mesmo diante da ausência quase total de referências explícitas ao filósofo prussiano. Partimos do pressuposto de que, embora silenciada pelo contexto ideológico do stalinismo, a influência nietzschiana manifesta-se de forma velada na concepção bakhtiniana do carnaval. Para tanto, examinamos quatro eixos de análise: o contexto intelectual russo das primeiras décadas do século XX, elementos biográficos de Bakhtin que favorecem a recepção de Nietzsche, as aproximações teóricas já propostas por intérpretes ocidentais e, por fim, a leitura interna da obra. Os resultados apontam que categorias centrais do pensamento nietzschiano – como o dionisíaco, o eterno retorno e a crítica às hierarquias sociais – foram reelaboradas por Bakhtin a partir de sua perspectiva sobre a cultura popular, assumindo feições comunitárias e coletivas em contraste com o individualismo aristocrático de Nietzsche. Concluímos que a relação entre ambos não deve ser entendida como mera coincidência temática, mas como diálogo implícito e criativo, que amplia a compreensão do carnaval bakhtiniano como categoria filosófica, estética e antropológica.