n. 21 (2021): 250 anos de O Uraguay
O Uraguay, de Basílio da Gama (1741-1795), publicado originalmente em 1769, é decerto uma das obras mais relevantes de nosso período colonial, e tem provocado, desde sua aparição, um interesse vívido da crítica. É sempre difícil precisar o porquê de uma obra apresentar tal poder de irradiação, assim como a capacidade de manter esse vigor ao longo de gerações. Neste caso, se deve certamente ao engenho poético de Basílio da Gama, que aos 28 anos escreveu o seu melhor e mais complexo poema. O despojamento estilístico bem ao gosto do tempo, amparado pelo uso dos decassílabos brancos e pela limpidez da escrita, nunca descai em mero prosaísmo e os elogios ao acabamento estético de O Uraguay têm sido a regra desde o início de sua recepção. Considere-se, como exemplo, o elogio de Lourenço Kaulen, já em 1786: “Senhor Gama, grande poeta a meu ver”; em um texto, no entanto, que se pretende o mais adverso possível às ideias do poema.
Mas a permanência de O Uraguay se deve também em grande parte à sua matéria, aberta às polêmicas mais ásperas, tanto as do próprio tempo do poeta (antijesuitismo e iluminismo, por exemplo), quanto a outras, de alcance mais amplo, como, por excelência, o dramático encontro de culturas entre o europeu e o índio – uma experiência muito particular de humanidade, que está na raiz do processo de constituição do Brasil, com as tremendas consequências que conhecemos.