A desqualificação das histórias (in)familiares: análise discursiva na suspensão e destituição do poder familiar
DOI:
https://doi.org/10.1590/0103-6564e230011Palavras-chave:
acolhimento institucional, destituição do poder familiar, proteção social especializadaResumo
Este estudo analisou o percurso de quatro famílias, destituídas do poder familiar, pelo Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente no Brasil. A análise do discurso de orientação psicanalítica foi empregada no corpus de informações de cada caso, compreendido por documentos relativos ao acompanhamento dos casos e entrevistas, realizadas com familiares e agentes institucionais. Os resultados apontam para formações discursivas que naturalizam ações judiciais punitivas de suspensão ou destituição do poder familiar, aplicadas hegemonicamente às famílias pobres, nas quais as mulheres são as principais culpabilizadas pelas falhas na gestão de cuidados. Verifica-se, também, a descontinuidade do acompanhamento, retomado quando há repetição da aplicação dessas medidas protetivas, assumindo a característica sintomática de falha. A escuta dos atores desses processos surge como uma estratégia de retificação subjetiva, ultrapassando práticas prescritivas e normativas, ratificadoras da exclusão e de criminalização da pobreza, particularmente das famílias negras.
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