Trabalhadores, tecnologia e saúde: a construção da cardiologia como especialidade médica no Brasil (décadas de 1930 e 1940)
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9141.rh.2023.195844Palavras-chave:
cardiologia, trabalhadores, especialidades médicas, eletrocardiografia, relações científicas transnacionaisResumo
O artigo examina a constituição da cardiologia como especialidade médica no Brasil nas décadas de 1930 e 1940. No contexto de implementação do sistema de proteção social pelo governo de Getúlio Vargas, as doenças cardiovasculares ganharam visibilidade no debate sobre a saúde e a produtividade dos trabalhadores urbanos. Alguns médicos defenderam que o diagnóstico, o tratamento e a prevenção dessas enfermidades requeriam conhecimentos e práticas especializados, como a eletrocardiografia. A disseminação dessa tecnologia no Brasil se beneficiou dos intercâmbios com médicos estadunidenses, intensificados na época pela Política da Boa Vizinhança. Argumentamos que o estabelecimento da cardiologia como especialidade resultou da associação entre demandas para a reprodução da força de trabalho, interesses socioprofissionais no campo médico e redes transnacionais de cooperação científica interamericana.
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