Ser sujeito em língua estrangeira: uma constituição possível?
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2316-3976.v2i3p68-81Palavras-chave:
Enunciação, língua estrangeira, língua francesa, língua materaResumo
O processo de apropriação de língua estrangeira é muito frequentemente estudado segundo os erros que aprendizes apresentam ao tentarem expressar-se nessa outra língua. Neste trabalho, o dizer do sujeito e aquilo que não é dito conforme a regularidade da língua-alvo constituem-se fonte de pesquisa; visamos a compreender o processo de apropriação dessa língua, que já nasce sob a égide de uma outra – a materna – e de um sistema simbólico constituído – a linguagem. A partir do questionamento acerca da possibilidade ou impossibilidade de um sujeito apropriar-se de outra língua tal como se apropria da língua materna, analisamos, mediante produções de um brasileiro aprendiz de francês, o valor da língua materna para o sujeito, a primeira língua que o inscreve no mundo.
Valemo-nos dos escritos saussurianos no Curso de Linguística Geral para delimitar os conceitos de língua/fala – respectivamente objeto da apropriação e meio de expressão – e também da abordagem enunciativa de Émile Benveniste, que, com a concepção de subjetividade na linguagem, possibilitou-nos entrever a singularidade constitutiva de cada tentativa de apropriação de língua estrangeira. As contribuições de Revuz e Melman auxiliaram-nos, igualmente, na compreensão dos desafios que se apresentam ao aprendiz na sua tentativa de reivindicar-se sujeito em língua estrangeira.
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Referências
- “quando falamos uma língua estrangeira, (...) o retorno do recalcado não poderá mais ser escutado como a expressão de um desejo, mas apenas como a expressão de erros gramaticais, sintáticos, lexicais, etc.” (MELMAN, 1992, p. 45).
- "Entre tantas dualidades, somente a língua pareceria suscetível de uma definição autônoma (...). [Já que] é ao mesmo tempo um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social – [os falantes] – para permitir o exercício da faculdade de linguagem nos indivíduos." (CLG, p. 17)
- “O estudo da linguagem comporta, portanto, duas partes: uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência (...); outra, secundária, tem por objeto a parte individual da linguagem, vale dizer, a fala (...).” (CLG, p.27)
- “a língua é necessária para que a fala seja inteligível (...) ; [e que a fala] é necessária para que a língua se estabeleça” (CLG,p. 22)
- a fala é um “ato individual de vontade e inteligência, no qual convém distinguir: 1º, as combinações pelas quais o falante realiza o código da língua no propósito de exprimir seu pensamento pessoal; 2º, o mecanismo psico-físico que lhe permite exteriorizar essas combinações. [grifo nosso] (CLG, p..22)
- “relações baseadas no caráter linear da língua”, o que se traduz pela “impossibilidade de pronunciar dois elementos ao mesmo tempo” e pelo “alinhamento dos sintagmas, um após o outro, na cadeia da fala” (CLG, p. 142)
- “uma palavra qualquer poder sempre evocar tudo quanto seja suscetível de ser-lhe associado de uma maneira ou outra” (CLG, p. 144)
- o “tesouro interior que constitui a língua de cada indivíduo” [grifo nosso] (CLG, p. 143)
- para Saussure a parte fundamental da linguagem e uma instituição simbólica, para propô-lo como sendo a linguagem em uso, o discurso (BARBISAN, 2007)
- “a língua não é senão possibilidade de língua” (PLG II, p. 84)
- “fazer funcionar a língua por um ato individual de utilização” [grifo nosso] (PLG II, p. 81)
- Enquanto realização individual, a enunciação pode definir-se em relação à língua, como processo de apropriação. O locutor se apropria do aparato formal da língua e enuncia sua posição de locutor mediante índices específicos, de um lado, e por meio de procedimentos acessórios, de outro. (...) O ato individual de apropriação introduz ao que fala sua própria fala. Há, aqui, um dado constitutivo da enunciação. A presença do locutor na sua própria enunciação faz com que cada instância do discurso constitua um centro de referência interna. [grifo nosso] (PLG II, p.84-85)
- “só se produzem na enunciação e pela enunciação” (PLG II, p. 84-85)
- , “a consciência de si mesmo só é experimentada por contraste” (PLG I, p.286)
- “implicam um gesto que designa o objeto ao mesmo tempo que designa o local do enunciador” (PLG II, p. 85).
- “na linguagem e pela linguagem que o homem se constitui como sujeito, porque só a linguagem fundamena na realidade, na sua realidade que é a do ser, o conceito de ‘ego’” [grifo do autor] (PLG I, p. 286)
- “da emergência no ser de uma propriedade fundamental da linguagem. É “ego” que diz “ego”. Encontramos aí o fundamento da subjetividade que se determina pelo status linguístico de pessoa.” [grifo do autor] (PLG I, p. 286)
- Mesmo antes de poder articular o mínimo som, a criança se encontra já imersa dentro de um universo de palavras, e (...) essas palavras, mesmo que não as possa reproduzir, nem produzir outras a partir delas, não são para ela menos dotadas de significação. As crianças não podem se subtrair às falas de seu ambiente. (...) Cada um que se ocupa dela [da criança] fala dela, coloca em palavras o que percebe dela, de seu “jeito de ser”, de suas semelhanças, de suas necessidades. (...) assim, muito tempo antes de poder falar, a criança é falada intensamente pelo seu ambiente. (REVUZ, 1998, p. 218-219)
- , “o locutor se apropria do aparelho formal e enuncia sua posição mediante índices específicos, de um lado, e, por meio de procedimentos acessórios de outro.” (PLG II, p. 81)
- “os elementos [da língua] se mantêm reciprocamente em equilíbrio” (CLG, p. 63)
- “os valores são sempre constituídos por uma coisa dessemelhante, suscetível de ser trocada por outra cujo valor resta determinar, e por coisas semelhantes que se podem comparar com aquela cujo valor está em causa” (CLG, p. 132)
- “a única questão que um signo suscita para ser reconhecido é a de sua existência e esta se decide por um sim ou por um não (...) pelo conjunto dos membros de uma comunidade linguística” (PLG II, p. 67)
- “modo específico da significância engendrado pelo discurso” (PLG II, p.67)
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