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João Cabral de Melo Neto: poesia e outras linguagens
Núm. 22 (2022)Dossiê: João Cabral de Melo Neto: poesia e outras linguagens
Desde a sua estreia, na década de 1940, João Cabral de Melo Neto tem sido considerado pela crítica como o dono de uma voz poética particular e até mesmo marginal em face da literatura produzida na língua portuguesa. Uma das razões dessa singularidade é o intenso diálogo com diferentes linguagens artísticas, que desde os primeiros livros se tornou uma das obsessões do poeta. Tal interesse pelas outras artes foi além da pintura e da arquitetura, seus modelos iniciais, englobando também a tipografia e artes populares como o flamenco e a tourada. O trânsito entre a poesia e outras linguagens ou expressões culturais, no caso de João Cabral, parece estar estreitamente ligado aos traços distintivos de sua obra poética, como a problematização do conceito de poesia, a recusa do “lirismo”, a busca do concreto, a porosidade, a “impureza”, o desejo de “falar com coisas” e a atenção diversificada aos contextos sócio-culturais. Este número da revista Teresa reúne artigos que abordam, em suas diversas modalidades e implicações, esse diálogo do poeta pernambucano com as demais linguagens artísticas. Apresenta ainda alguns documentos raros e inéditos - textos publicados na imprensa e cartas de João Cabral ao cronista Rubem Braga -, resenhas de livros recentemente publicados e poemas inéditos de Alcides Villaça e Ricardo Aleixo.
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250 anos de O Uraguay
Núm. 21 (2021)O Uraguay, de Basílio da Gama (1741-1795), publicado originalmente em 1769, é decerto uma das obras mais relevantes de nosso período colonial, e tem provocado, desde sua aparição, um interesse vívido da crítica. É sempre difícil precisar o porquê de uma obra apresentar tal poder de irradiação, assim como a capacidade de manter esse vigor ao longo de gerações. Neste caso, se deve certamente ao engenho poético de Basílio da Gama, que aos 28 anos escreveu o seu melhor e mais complexo poema. O despojamento estilístico bem ao gosto do tempo, amparado pelo uso dos decassílabos brancos e pela limpidez da escrita, nunca descai em mero prosaísmo e os elogios ao acabamento estético de O Uraguay têm sido a regra desde o início de sua recepção. Considere-se, como exemplo, o elogio de Lourenço Kaulen, já em 1786: “Senhor Gama, grande poeta a meu ver”; em um texto, no entanto, que se pretende o mais adverso possível às ideias do poema.
Mas a permanência de O Uraguay se deve também em grande parte à sua matéria, aberta às polêmicas mais ásperas, tanto as do próprio tempo do poeta (antijesuitismo e iluminismo, por exemplo), quanto a outras, de alcance mais amplo, como, por excelência, o dramático encontro de culturas entre o europeu e o índio – uma experiência muito particular de humanidade, que está na raiz do processo de constituição do Brasil, com as tremendas consequências que conhecemos.